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    MAR E CÉU

     

    Sem quê nem por quê, já estávamos na Sernambetiba 5500. 22º andar, tijucamente instalados, apreciando o mar e aproveitando feriados para o merecido descanso. Mar e céu! Este tão azul, tão brigadeiro, rasgado graciosamente por pontos brancos, aqui e acolá.

     Aquele, por sua vez, brincalhão, alterava sua cor, aperfeiçoando assimetricamente as ondas daquele dia de intenso calor. Do outro lado do “flat”, a Avenida Ayrton Senna. Mais adiante, a Avenida das Américas... O Barra Shopping. Além... Jacarepaguá, com seus edifícios modernos. E, mais à direita, as montanhas. As montanhas verdes e cariocas, encontrando meus olhos poetas.

    Queria permanecer ali, mas o mar e céu convidam-me, com insistência, para senti-los, tocá-los com meu corpo e totalmente.

    - Vamos, Cida!

    - Pode ir, vou sair com sua irmã Lúcia e duas amigas dela. Divirta-se  como você gosta. Eu gosto é de shopping. Você não se importa né? Então me empresta seu cartão de crédito!

    Nem discuti. E para quê? Elas são urbanas... Eu tenho ódio de lojas, shoppings... Muita gente... E lá se foi meu cartão de crédito!

    Short, bermudas, toalha, cadeira de praia e sombrinha. Desci. Respirei o ar vindo do oceano, tão eternamente misterioso.

    Sem dúvida, ir à praia, hoje, sozinho, é melhor! É tão gostoso, de vez em quando. O silêncio não era monótono. Estava agraciado com o vento... E o “ chaummmm” das ondas, brincando de ire vir na praia e nos pés da criançada me fazia sorrir.

    - Olha o picoléééé´! Olha o Pic... Olééééé!

    - Coco, coco geladinho, madame!

    - Obrigada!

    - De nada!

    - Queijinho.. Lá de Minas! São nove horas, trinta e dois minutos! Queijinho. Queijinho!

    Quer algo melhor do que isso? Divertia-me com os mais interessantes tipos ali na praia da Tijuca.

    De repente, ai, meu Deus! A vinte passos de mim, surge uma toalha, canga, saída, como se chama aquilo? O vento até deu uma trégua para a bela morena festejar seu corpo, tocar os pés, tirar os chinelos, colocá-los cuidadosamente na areia, deitar-se se na toalha, óculos escuros, passar protetor solar. (ai que sede!). E a prima ou parente próxima de Vênus, retirando a blusa azul-claro e já o biquíni branco-marrom, tão perfeito naquelas curvas gananciosas e morenas a poucos passos de mim.

    -Estou doente... Meu Deus!

    Ao largo, passa um catamarã. Procuro olhá-lo, desviar minha atenção, sentir a alegria contagiante daqueles que ali festejavam o deslizar pelo mar. No entanto, a musa morena, passando devagarzinho o protetor solar, brincava com as mãos, pernas, obrigando-me novamente a desviar os olhos do mar e dirigi-los fingidamente para ela. Lembrei-me de Pablo Neruda:

    “... Niña morena y ágil, el sol que hace las frutas,

    El que cuaja los trigos, El que tuerce las algas,

    Hizo tu cuerpo alegre, tus luminosos ojos

    Y tu boca que tiene La sonrisa del água”.

    - Casquinha de siri!

    - `Panela de alumínio!

    – Reeedi ! Reeeeedddiii!

    Estes últimos, vendedores de redes nordestinos, queimados pelo trabalho e pela exploração de quem os trazia até aqui..

    E eis que, entre a morena e mim se instala, desaforadamente, ente, uma família. Roubava-me o prazer... A bela paisagem e a lembrança, sempre fértil de alguma fruta campesina. Olhei discretamente (?) para um lado e outro. Levantei-me e mudei de lugar. Afinal, pô! E por que não?

    Novamente o sorveteiro:

    - Pic.... oléééééééééé´! De abacaxi, coco, limão, chocolate, manga... ( e uma ladainha sem fim e informando as horas e perguntando “ -você quer?”

    - Picolé de frutas... Num guento... Quero dois... São cinco reais. Entregue um para aquela.... Ah! Eu fico com os dois. Mar e céu! Picolé de frutas! Agora era demais. Tem até fruta jambo? Ele não entendeu, num tem importância; Sorri pra mim mesmo... Mas que aquela morena tem a cor da fruta jambo... Ah! Isso tem!

    Ah! Querido leitor, me ajude. Agora qual deve ser minha melhor opção?

    a)      Rezar e pedir a Deus que me acalme.

    b)       Procurar um psicólogo.

    c)        Deixar de ser besta.

    d)       Nunca mais ir à praia.

    e)      Saborear uma deliciosa salada de frutas, ( com muito ambro).

    E já meio atordoado, aparece a Cida e tocando sorridente meu ombro, inocente e diz:

    - Busque para mim um coco gelado, MARCEL!

              Heleno Célio Soares