ESCRITOS HELÊNICOS - RETIRO DAS ROSAS




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  • Retiro das Rosas

     

    Para te dizer... Não são fieiras de rimas

    Apertadas... Mas com o coração bem mais largo...

    Muito obrigado! Muito obrigado, você sabe!

    Aprendo a solavancos perceber a vida,

    Senti-la, como numa raspada de vento.

    E reconstruir cada momento,

    Em pétala de rosa inflamada.

     

    Foi lá. Montanhas verdes, em cúpulas tão arredondas, dizendo-me com a sabedoria da antiguidade: “- Ainda estou aqui, Conae!” Céu enevoado. Um convite para o mergulho necessário e para abafar o grito que não deve mais a outros incomodar. Afinal, não é ele, agora, desavindo? E o encanto?... Não pode mais estender-se, se tem de buscar antigo ninho e reviver como pássaro de arribação?

    Desce o olhar e as construções pequenas e brancas, aos pés das serras, vão escutando o tremor forte dos caminhões de minérios, ônibus e carros, no movimento contínuo da Tiradentes. De lá para cá, rosas... Rosas... Rosas.

     

    Não! Não é fuga covarde,

    Nem clamor desesperado.

    Nem é o domínio da neblina

    Onde o capim verde se agasalha.

    Nem é preciso apagar mais o incêndio.

    Só entendê-lo.

    Afinal, por causa dele nasceu novo campo.

    Apareceu novo e antigo horizonte,

     

    E lá... é onde se deve armar a tenda.

    Um lago... Não estava azul! Estava chovendo e, por isso, turvo. Patos a dezenas, alguns brincando no meio da água, outros tão quietos, nasnbeiradas. Por que não? Não somos também nós assim? Já se aproximando da janela, de madeira, nem tosca, nem moderna, a fonte de Treze Suspiros, num convite supremo para ponderações íntimas. Aquele momento não consta de calendário, não interrompe nada, nem é rota de estrelas. O poeta está somente em eclipse, mas não se perde. E os olhos percorrem as rosas e deixam firmes pegadas, perfumando com seu próprio aroma os segredos, ali, ora semeados.

    Beija-flores lépidos, canários da terra ou canários chapinhas, aos montões, e rosas... Numa visão esplendorosa que perpassa o que pode a palavra exprimir.

    A idéia era estar só. Conversar somente com o coração e buscar entendimentos não dourados em versos.

     

    As flores não calavam,

    O vento também não.

    Vim para recobrar forças,

    Não para cultivar rosas no retiro.

    Não para novamente ter os olhos úmidos,

    Ou acolher estigmas jamais vistos.

     Ora, estou sozinho! Coincidência sua presença aqui, Marcel?

     

    - Presente, Conae! Não que desejasse interferir. Mas não entendo algumas habilidades do conhecimento que se desenvolvem a ponto de afastá-lo do campo de batalha.

     Por favor, meu irmão-germano. Hoje não! Mas o conheço e não me deixará sozinho, não é?

    - Em hipótese alguma posso aceitar que medo seja antônimo de coragem. Assim como preto não é perfeito antônimo de branco ou felicidade seja antônimo de infelicidade, meu caro Conae!

    - Discutir campo semântico agora? Tá louco, sô! Também é verdade que sinônimos perfeitos só existem na gramática. Branco é sinônimo de claro? Preto é sinônimo e escuro? E daí? Na verdade, o que você faz aqui? Eu tenho uma razão, Marcel! Vim aqui para descobrir a diferença entre medo e coragem. Por isso, meu isolamento. Estou com medo, meu irmão-germano, mas ninguém pode saber disso. É muito difícil para mim admitir tal. É como se eu tivesse que enfrentar um animal selvagem e mais forte do que eu.

    - Por isso o medo, Conae? Para se ter coragem, meu irmão, faz-se necessário o medo. Algo que necessariamente favorece o sentido da auto-conservação. A confrontação dessas duas forças nos impulsa a uma espontaneidade de ação e reflexão, como um instinto que desperta em nós para nossa defesa. O medo, caro irmão, só o vence, se você deixar. Por isso estou aqui, para pensar com você, mas me retiro o mais rápido possível.

    - Preciso de energia suficiente para resistir ao que acontece comigo, você sabe. Uma energia, uma organização. Minha consciência precisa se orientar para sua finalidade e estar atenta. Entendo que o fim é sempre o bem, e mesmo como ser humano, se me dirijo ao inadequado, é sob a forma de bem que se o quer.

    - Também aprendeu a filosofar, Conae? Então vamos lá. Entre a concepção do fim e sua execução, medeia um intervalo de elaboração do ato voluntário.

    - Isso, Marcel! Assim estou chegando ao momento da deliberação. Sei que nesse intervalo existem, simultaneamente, uma energia, uma organização e um tempo suficientes.

    - Estou indo embora, Conae. Você não precisa mais de mim. Você, mesmo com o sofrimento, meu irmão, tem uma vontade prudente que é aquela que se manifesta por atos praticados após madura deliberação. Ah! Eu o entendo. Sua vontade não é rápida, mas é enérgica e é feita em cima de muito amor. E como explicar o amor, não é mesmo? Há muitas maneiras de amar. O que não se pode fazer é deixar alguém no sofrimento, por causa do egoísmo e da própria satisfação. E sua saúde, meu irmão?

    -Vá embora, Marcel! Fico aqui até amanhã. Chegou finalmente minha hora. Preciso entendê-la. Chegou a hora da batalha. Medo e coragem se unirão. Por causa do medo tenho mais força para enfrentar situações.

    - Era uma vez, lá na antiga Grécia... Até logo! Até logo!

    Lembrei-me sim da história do Labirinto. Era uma vez, lá na antiga Grécia... Vontade prudente, vontade enérgica, vontade rápida. Lembro me sim.

    E o Retiro das Rosas foi, aos poucos, sumindo e se distanciando de meu carro, não de mim.

     

    Mais uma vez,

    Atônito, mas sem zanga,

    Sorri e disse:

    É agora!

    Incendiei o ar de amor,

    E o respirei.

    Foi a tortura do Poeta...

    Também de sua dignidade.

    Busco, então, novamente, o caminho,

    A respiração já não é tão opressa.

    Heleno Célio Soares