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    De Banana

     

     

    Tenho um casal amigo, morando em Itaúna, bairro Santanense, e que, semanalmente, promove em sua casa uma noite para  contar “causos ”e trocar receitas culinárias. Um dos participantes (e hoje a receita é dele) mora em Garcias. É bem capiau, sabe disso, porém ótimo cozinheiro, além de fazer o pessoal rir muito. Baixinho, paletó grande, chapéu bem usado, passos leves, risinho marcado pela ironia, puxado para o lado esquerdo da face, eis o nosso personagem.

    - Boa noite, dona Wanda! Eu truxe uma receita nova e simples. É de banana.

    - Xi! Mas hoje estamos conversando sobre política, seu Candô! Interveio o marido da Wanda, metido a líder do grupo, sorrindo nem tão disfarçadamente.

    -É mió memo mudá de assunto! Óia aqui no meu imbruio. Uma bolo de banana. Até purque arguém me falô qui pulíticu e salchicha... se ocêis subessem de que são feito...

    Este aqui eu fiz pra agradá ocêis, sô! No final, ocêis me pagam quinze reais. Sempre qui tragu um trem procêis, vem do coração. E o dinheirinho é bão taméim, né?

    - Então, qual é a receita de hoje? Ou foi sua mulher quem fez o bolo, seu Candô?

    - Assim ocê me ofende! Vô me imbora. Quem nasce em Garcia num leva desaforo de vorta não!

    - O Vicente tá é brincando! Ele não respeita nem mais o Estatuto do Idoso! Vamos lá! Dê-nos a receita e desculpe!

    -Mais... A sinhora tá me chamano de véio? Hara! Tá bão! Primero ocê pranta a bananera. Jogue água nela todo dia.

    - Espere! Plantar bananeira?

    - É certo! Ocê num dirrubô uma? Intão plante otra, sinão as bananerada acaba. E jogue água nela toda manhazinha. Bananera gosta dágua. Isso é prela crecê e ficá forte e bem sardave. E a bananera qui ocê dirrubô prá tirar o cacho de banana, você interra, prela virá isterco...

    Era  assim que  falava e, como professor, nos ensinava sobre a natureza do plantio. E lembrando os filósofos da natureza:  “... Nada pode surgir do nada ... “  ( Por isso plante outra bananeira).

    Diabo, sô! Um capiau de Garcias, em Santanense, Itaúna, na casa de meus amigos... E  resumindo e esclarecendo o que os três filósofos de Mileto, colônia grega, na Ásia Menor, já discutiam: Tales, Anaxímandro, Anaxímenes. Pois é!

    - Quando elas tivé divêis, corta a bananera e tire as banana em penca. Num machuca elas não! Dexa madureceno. Dispois,  tira treis ou quatro banana. Ah! Tem di sê caturra. Pôe elas pur cima das mão pra vê si istão durinha, ou  mais e menos madura, bem mió é não estar bem madura, mais que de vêis e botar as banana durinha nas mão...

    - Eh.eh.eh.eh... Interrompeu o dr. Demóstenes, advogado em Itaúna.

    -Agora é cuzinhá. Inhantes, corte elas em rodela e bate até ficar aquela sopinha, um cardinho de botar água na boca. Intão, pega com cuidado dois ou treis ovo, com as gema bem vermelhinha e duas xicra de chá de açúcar.

    - Eu só tenho dois ovos, interrompeu um gaiato.

    - Respeito é bom, Roberto! Forçando para não rir, lá veio a Wanda.

    Enquanto isso, o bolo tão simples, trazido por aquele homem tão simples, aguçava o paladar de todos e... O instinto de...

    - Agora, põe duas e meia colher de  chá de farinha de rosca.

    - É só falar em” banana”...”rosca”... Fico toda enroscada. O riso encheu  o ambiente.

    - Ah! Se Freud estivesse ali. Ele diria: “ ... um desejo terrível, egoísta, veio à tona dela...” E ainda completaria Freud: “ - Impulso! Impulsos que determinam os pensamentos... impulsos irracionais trazem à luz instintos e necessidades que estão profundamente enraizados dentro de cada um. “

    - E neste caso, foram as “bananas e a rosca”, né, seu intrometido? (Com risos de todos, exceto do “ receitador.” )

     Fiquei  pensando no Freud, enquanto também ria em silêncio. Ele  dizia que a mente humana era fantástica e que guardamos tudo o que vimos e vivemos. E que, inconscientemente, uma palavra aqui, outra ali, servem de inspiração para  que  nossos sentidos reacendam os desejos mais recônditos  e nossa libido.

    -E o que isso a ver com  a torta de banana?

    -Tudo. É só olhar a face de cada um aqui dentro da sala.

    - Posso terminá? Inhantes de  terminá a receita, vou contá uma história: “Havia um oficiá do exército, meio doido,  mentiroso toda vida, que um dia...

    - Pare! Continua a receita! Deixa a história para outro momento! Melhor... no fim do ano.

    - Intão, põe uma colher de sopa de canela em pó e mais uma colher de sopa de fermento... E óleo também, viu? Assim: Uma xícra de chá, menos um dedo. A preferença é pra óleo de mio. Agora, misture tudo e asse em forma ou tabulero untado e porvilhado e com açúca e canela.

    - Assar por quanto tempo?

    - Mais ou menos vinte e cinco minuto e o forno  já deve estar um pouco quente. Indendeu? Agora é a vêis docêis.

     

    Resumo:      Bolo de Banana     ( ingredientes )

    . 3 ou 4 bananas batidas ( de preferência  caturra, com três ovos inteiros.)

    . 2 xícaras (chá) de açúcar.

    . 2 e meia xícaras de chá de farinha de rosca.

    . 1 colher de sopa de fermento

    . 1 xícara (chá) de óleo.

    . Misturar tudo e assar em forma ou tabuleiro untado e polvilhado com açúcar e canela.

    . Depois assar o bolo por mais ou menos 25 minutos, em forno pré-aquecido.

    . Passar no açúcar com canela e levar a metade do bolo para o Pisca-Pisca.

    Heleno Célio Soares