• ELA CHEGOU NA NOSSA FRENTE!

     

    A Igreja reza aquilo que aprende e aprende com aquilo que reza. Assim acontece com o Ano litúrgico, no qual percorremos os mistérios de nossa fé,  acompanhando a História da Salvação, para penetrarmos no Mistério Pascal  de Morte, Ressurreição e Ascensão de Jesus e a vinda do Espírito Santo.  Entretanto, também as pessoas que se envolveram no mistério da fé são  lembradas no Ano litúrgico, começando pela Virgem Maria. Sua participação  no mistério de Cristo começou com a livre escolha daquela que viria a ser a  Mãe do Verbo de Deus encarnado, passou pelas realidades do nascimento, vida  em Nazaré, Caná, discipulado, Cruz e Ressurreição e o Pentecostes, quando se  preparou unida à primeira comunidade cristã. Presente à Comunidade  primitiva, a tradição nos indica sua vida em Éfeso, outros dados a mostram em  Jerusalém, até chegar à participação no mistério da morte, delicadamente  chamada de “dormição” de Nossa Senhora. Como foi por graça preservada do pecado, em previsão dos méritos de  Cristo, desde os albores da vida da Igreja cresceu a convicção de sua Assunção  ao Céu em Corpo e Alma, não vindo o seu corpo a se corromper. O Dogma da  Assunção foi proclamado pelo Papa Pio XII em 1950 (Constituição Apostólica  Munificentissimus Deus). Diz o Papa: “Nas homilias e orações para o povo na  festa da Assunção da Mãe de Deus, santos padres e grandes doutores dela  falaram como de uma festa já conhecida e aceita. Com a maior clareza a  expuseram; apresentaram seu sentido e conteúdo com profundas razões,  colocando especialmente em plena luz o que esta festa tem em vista: não  apenas que o corpo morto da Santa Virgem Maria não sofrera corrupção, mas  ainda o triunfo que ela alcançou sobre a morte e a sua celeste glorificação, a  exemplo de seu Unigênito, Jesus Cristo. São João Damasceno, entre todos o  mais notável pregoeiro desta verdade da tradição, comparando a Assunção em  corpo e alma da Mãe de Deus com seus outros dons e privilégios, declarou com  vigorosa eloquência: convinha que aquela que guardara ilesa a virgindade no  parto, conservasse seu corpo, mesmo depois da morte, imune de toda  corrupção. Convinha que aquela que trouxera no seio o Criador como  criancinha fosse morar nos tabernáculos divinos. Convinha que a esposa,  desposada pelo Pai, habitasse na câmara nupcial dos céus. Convinha que,  tendo demorado o olhar em seu Filho na cruz e recebido no peito a espada da  dor, ausente no parto, o contemplasse assentado junto do Pai. Convinha que a Mãe de Deus possuísse tudo o que pertence ao Filho e fosse venerada por  toda criatura como mãe e serva de Deus”.

    Os dogmas de fé não são fruto de decisões voluntaristas dos sucessores  de Pedro, mas resultado de uma experiência profunda e arraigada da fé no meio  do povo de Deus, amadurecida no decorrer dos séculos. É bonito saber que os  Papas proclamam o que o Espírito Santo já revelou ao conjunto dos fiéis que,  por sinal, não pode errar em matéria de fé! Assim foi com a Assunção de Nossa  Senhora.

    E como acontece com tudo o que a Igreja professa e celebra, esta verdade  da fé é carregada de lições. Assunção quer dizer que Maria foi assumida,  elevada e levada ao Céu. Jesus subiu ao Céu na “Ascensão” por ser Deus, Maria  foi conduzida pelos méritos de Cristo, tendo chegado à nossa frente para ser  sinal seguro de esperança, pois todos temos a eternidade como ponto de  chegada. Esta é uma primeira lição. Fomos destinados à eternidade e não feitos  para rastejar. A plenitude existe e caminhamos para alcançá-la, o que exige  um olhar mais amplo e um horizonte mais alto, a fim de não nos acostumarmos  com as dificuldades do dia a dia, ou nos imaginarmos demasiados pesados  para a felicidade completa. E ela já existe aqui e será plena junto com Deus.

    Saber que Maria já chegou traz consigo uma certeza de que temos uma  mãe no Céu, o que não é pouca coisa. Afinal, não passa um dia em que o cristão  deixe de dizer “Santa Maria Mãe de Deus, rogai por nós pecadores”. E ela reza  por nós, acompanhando nossa fadigosa peregrinação terrena com coração de  mãe, cheio de ternura e desvelo! Se o Céu já acolheu o corpo e uma alma de uma criatura como Maria, é  bom olhar ao redor e valorizar todas as realidades humanas. Cristão que se  preze reconhece a importância das criaturas postas pelo Senhor à nossa  disposição. Não joga fora a oportunidade de um sorriso, as mãos que se abrem  para a partilha, as alegrias mais simples da convivência humana. Olha para a  natureza e se empenha em cuidar do meio ambiente. Vale para ele varrer uma  casa, plantar uma árvore, recolher o lixo, respeitar o trânsito. Mais do que isso,  o cristão abre os olhos para as situações humanas que existem em torno de si,  para edificar na partilha e na caridade um mundo diferente, que ele sabe ser  possível e urgente.

    Entretanto, como é costume em nosso país, a festa da Assunção põe em  relevo uma vocação tipicamente mariana, a vida religiosa, cuja missão é plantar  os valores do Evangelho e da eternidade em nosso tempo. Os religiosos e  religiosas têm a responsabilidade de alertar a Igreja e os cristãos para a  precariedade existente em muitas escolhas das pessoas, iludidas pelo  consumo, pelos prazeres enganosos, a falta da fraternidade, o engano dos  projetos falazes que a nada conduzem.

    Desejamos agradecer a tantos irmãos, sacerdotes ou não, e a tantas  irmãs religiosas na vida consagrada, pelo testemunho profético que oferecem à  Igreja. Ao mesmo tempo, desejamos que sua presença atraia poderosamente  muitos jovens, rapazes e moças, à vocação da radicalidade evangélica. Olhando  para estas pessoas consagradas, nossa juventude, feita para grandes ideais,  sabia reconhecê-los presentes em homens e mulheres bem concretos,  dedicados ao testemunho de Jesus Cristo, nos ambientes mais pobres e  desafiadores, assim como na educação e no fermento pastoral de tantas  comunidades.

    Dom Alberto Taveira Corrêa

    Arcebispo Metropolitano de Belém/Pará

    FONTE: www.arquidiocesedebelem.org.br