•  

     

     

     

                    OBJETO PERDIDO

     

    Assenta-se ao piano. Enxuga as mãos sob o lenço.

    “Apresentará uma peça de Ludwig Van Beethoven:

    Sinfonia número 3, ‘Heroica’, Fidelio, Obertura.

    Sua extensa duração possui forte apelo emocional

    próprio do Romantismo.” - anuncia o locutor.

    - Por que a demora? Nosso virtuose virou penumbra?

    Enfim, abre a partitura, corpo pulsátil: impasse básico

    De artístico drama nessa quase duradoura alucinação.

    - O que houve?

    - Silêncio!

    Rápido, farto, deslisa os dedos sobre as teclas. Inicia-se.

    No 1º movimento, Allegro com Brio, advém-lhe

    um gozo primordial. E o 2º movimento, Marcha Fúnebre:

    Adagio Assai, alcança a orgástica plateia em primeiro plus

    De preenchimento além. Nota-se certo gosto de cereja,

    flan, sonho. O Outro, assistente, não completo, barrado,

    ouve em si a vã tentativa de obturar o vago vão interior.

    Algo indecifrável - um brilho, um Lá, o Finale Alla Fuga, -

    compõe as aparências. Há no ar certa busca do Infinito,

    contido na fantasia elucidativa do ermo concertista.

    Graça Rios/21