NUMA SOMBRA OUTRORA SEM FLORES - GRAÇA RIOS




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    NUMA SOMBRA OUTRORA SEM FLORES

     

    Segue-me: Há uma Tília cordata, árvore aromática, no meio do caminho. Bem feita de corpo, possui tronco teúdo bojudos seios. Um vento cheiroso desvia-lhe as folhas amarelas até este limbo dourado. Conheço a força mágica da Natureza.

     Possuo rosto moreno-pérola, grandes olhos dulcorosos, fronte emoldurada por cabelos escuros. Meu nome, queres saber? Lediça. Talvez o creias, Companheiro, apenas prenome absolutamente escorregadio, deslizante Bispo movendo-se por todas as casas do tabuleiro.

    Talvez lhe alteies acepção gozosa, elisão entre dois termos frutuosos por absurda associação sensual. Discuto contigo? Pois não. Talvez o releias como salto inesperado de Rei capturado.

    Algo assim, tapando a tua peneira, ó, leitor-sol. Perguntas-te, ainda, absorto em elucubrações:

    - Essa linguagem figurada existe? Resvalaria, feminina, no espaço repleto de furos, brechas, renda em arabescos? Poderia amordaçá-la, utilizando minhas práxis peças?

    Ah, ah, brinca a Pitonisa. Pensando bem, já estás movido para casa adjacente:

    - Lediça significaria Sacerdotisa. Oráculo que adivinha na leitura dos astros, dos vegetais, das vísceras dos animais mortos, o destino das pessoas. Prendo-a na armadilha dos braços e pernas.

    Antes que me desenhes estilo adversária, sobidesce descissobe preta/branca na entretela, retornemos ao princípio não-dito. Descrevo-me, ante teus horizontais olhos, bem talhada, louvada pelos povos da aldeia. Quando era virgem, fui ao campo cortar flores. E daí? Daí, um moço de teu igual talhe e, quiçá, de mesmo intuito diagonal, notou-me perfumada entre amadas margaridas, descalças azaleias, plenas centáureas. Encorajado Rei, extraiu do peito couraça, arco, aljava. Aproximou-se um tanto violento.

    - Sentemo-nos, ninfa alvissareira (mente babilônica). Gostarias de jogar comigo o Xadrez erótico, antigamente sagrado, sob o olhar do cervo, ali, também cheio das sábias habilidades? Faço de ti mor mulher com arte e engenho na Torre movimento de roque defensiva (amostrando mãos em cima da Torre erguida, basta florada).

    Espio o estranho expiando-me lunar. Ei-lo, tremendo vivo real num sonho em que tento apanhar alguma coisa indizível. Ou seja, A Coisa. O fim da Partida. Viso ao inexplicável inexorável porvir vindo de surpresa do tempo passado. Milênios alinhada ao chão, deitada à espera dele, entoo - pra me bendizer - a Cantiga que a Gente Canta. Depois, Os Amores que a Gente Quer.

    Difícil entenderes, ledor racional e incrédulo parceiro, nossa situação desarrazoada, vice-versa em ziguezague. Digamos, caro amigo: Trata-se do não-lugar da presente narrativa. Melhor, representá-lo-ei vazio lume vago. Entende-me vertical:

    - Concebes porventura aquele buraco fundo onde todas as palavras serão logo enterradas por mim, mulher prolixa em lendas ao pé da fonte ou na ribeira? Sim? Mais ou menos isso. Súbito, o ignoto astronauta agarra-me a cintura. Despe-me a camisa. Expulsa-me da roupa branca. Solta-me, andando o Peão, a vasta cabeleira. E eu, segurando-lhe firme a expandida famosa Torre, creio no ritual da antiquíssima Tília, durante o Culto à Fecundidade. Ulalá! Curvo-me, sempre ávida do desconhecido, durante a posse nua de obstáculos. Dama valiosa, ardo em febre possuindo o cru Cavalo, largado sumo entregue num rosal granado. Frouxa da voluptuosa ânsia, irei dizer à mãe e ao pai:

    - Da gleba vencedora, voo vou varrer vossa casa e lavar vossa ceroula.

    Abandonados na relva amarfanhada, jazem harpa, saltério, lira. Xeque-mate.