ESCRITOS HELÊNICOS - VERDADE LÓGICA




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    Verdade lógica

    Não sou enólogo, Vicente! Sou enófilo, ou talvez nenhum dos dois. Sou

    “ engólogo ” mísero aprendiz de vinhos, especialista em “ goleologia”.

    “Se, na verdade, já sou velho

    Melhor que os moços beber sei.

    E, se preciso for que eu dance,

    Brandindo um odre, dançarei!

    ( Pois, eu sou rei, desde que reino,

    Eu, de outro cetro, nunca usei).

    Se alguém quiser lutar comigo,

    Que me apareça, lutarei.

    A luta é báquica ou poética:

    De armas não gosto. Isso sabei.

    A minha taça

    Doce de mel e vinho ameno,

    Bem misturados, me trazei!

    Se já sou velho... em vinho e danças,

    Não sou menor que David,

    Sou Heleno,

    E, ainda a imitar o rei, dançarei”.

    - Imitando Xenofontes, heim caro poeta Heleno? Gostei. Imagino que este

    texto saiu logo após nosso último encontro aí em sua casa em que você me convidou para degustar um bom vinho. Foi muito bom. Tomamos Serendipia – uvas Garnacha com parcelas de Merlot, aroma de amora, baunilha e chocolate e saber intenso, com bastante corpo. E depois continuamos nosso papo sobre VERDADE, agora sob o efeito do “ in vino veritas.”

    - Pois é, Vicente. Em nosso diálogo anterior falamos sobre a verdade ontológica ou objetiva. (Volte ao texto anterior).  E hoje, discutiremos sobre verdade lógica que  consiste na conformidade da inteligência com o que é.

    - Quando você diz “conformidade da inteligência com o que é”você quer dizer que é a verdade do ponto de vista do conhecimento de quem afirma algo?Se for isso, eu concordo. Mas... Trago uma questão: Se quem expressa algo não tem conhecimento absoluto do fato ou questionamento, não seria apenas uma opinião? E assim, susceptível de erro?

    - Muito bom! E aí vamos ver o que seja “opinião” e bem diferente de “certeza “. A “opinião,” caro Vicente, é o estado de inteligência que afirma receosa de se enganar. Ela se baseia sobre motivos reconhecidamente insuficientes. Não! Nem vamos aqui falar sobre hidroxocloroquina e remédios milagrosos para Covid. Até porque não sou médico nem  infectologista. Mas é sempre bom lembrar casos em que o mestre de obra é mais competente do que o engenheiro.

    - Vou dar um passo além e, se quiser, me conteste. Em muitos casos, então a verdade lógica passa a ser mentira. E aí?

    - Ah! Prefiro dizer que é uma ignorância da pessoa que não quer sair de seu casulo, de sua caverna, ou como dizia no livro *O Mundo de Sofia*, de Jostein Gaarder, no capitulo “Uma estranha criatura”:  “-... Você arrumou um ninho bem confortável lá o fundo da pelagem de um coelho branco...” e agora não quer sair de lá,né?

    - Heleno! Estou me lembrando agora de 1971. Dezenas de trabalhadores da construção civil trabalhavam febrilmente para concluir as obras do Palácio de Exposições, na Gameleira, bairro da zona Oeste de Belo Horizonte.

    -Estou me lembrando, Vicente! A pressa para terminar as obras visava atender exclusivamente à vaidade do então governador Israel Pinheiro.

    Era um projeto fantástico, assinado por Oscar Niemayer. Desabou no dia quatro de fevereiro de 1971. Foram sessenta e sete mortos e dezenas de feridos e nenhuma das vítimas indenizadas. Dolo? Mens rea? Crime de prevaricação? No entanto, isso é discussão para nossos colegas exsecordianos, advogados juízes.. da área jurídica afinal.

    - Voltemos ao nosso tema, Pisca-Pisca. Você estava  dizendo que muita gente não tem coragem de sair da caverna e até me lembrou o *O Mundo* *de Sofia*. E também,como Neo em Matrix, temos que descobrir novos mundos  e duvidar das coisas que acontecem ao nosso lado. É não se conformar. Muitos de nós, nas diversas profissões em que trabalhamos, nos apegamos a algumas “verdades” e passamos até a sermos fanáticos. Só eu tenho razão. Ah! Isso é ser radical; é ridículo; é estar preso  `a Caverna. Poderia citar outros exemplos de radicalismos... Mas deixa prá lá.

    -Vicente, Deixa pra lá mesmo! Existem pessoas que constroem seus muros, suas “verdades” e são inflexíveis. Pronto! O filósofo observa.  Quero recorrer a Gustav Jung. Ele postulava que o “ceticismo” ou o apego à determinada “verdade” deveria ter por objeto unicamente teorias incorretas e por isso assestam-se as baterias contra fatos completamente certos.

    - Vou além, Heleno! A resistência contra fatos comprováveis, na minha opinião e tenho também certeza de que é a sua, provém principalmente da repugnância que algumas pessoas sentem em admitir a verdade cientificamente reconhecida. E não querem admitir os sérios prejuízos que causam e, de toda ordem, e em casos específicos, até a morte.

    - Bom tarde, Vicente! Um abraço e hoje é despedida sem vinho. O próximo será aí em sua casa.

    Heleno Célio Soares