ENTREVISTADO DO MÊS DE FEVEREIRO - Carlos Alberto Reis de Paula (Pai João)




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  • ENTREVISTADO DO MÊS DE FEVERERIRO

     

    PINGUE PONGUE COM CARLOS ALBERTO REIS DE PAULA (PAI JOÃO)

     

     

    1 - Pai João ou ministro, como você prefere ser chamado?

    Carlos Alberto. Entre nós, da Exsercordis, ser chamado de Pai João me leva ao tempo em que convivíamos na nossa casa, e me sinto muito bem. Esse período é inesquecível, pelo que vivemos e construímos juntos, trazendo-nos  boas lembranças de vários colegas.

    2 - Por que Pai João?

    O Miranda e o Walter Rosa escreveram uma peça em que se falava também de escravidão. O papel que me foi dado era de um velho senhor na comunidade, cujo nome era Pai João. Já no final da peça, ele morria, e era retirado do palco por uma padiola. Apesar dos ensaios realizados, quando me colocaram na padiola, eu, não sentindo confiança naquele “arranjo” que fizeram, apesar de estar morto,  movimentei as mãos para segurar os tubos das extremidades da padiola, e isto provocou muito riso. Aí, o apelido pegou.

    Por isto, quando um dos nossos me chama da Pai João, a lembrança é muito alegre. E me remete a esse bom tempo.

    3 - Na galeria dos ex-dirigentes do Tribunal Superior do Trabalho, criado em 1946, você é o 30º presidente numa lista de 33. Foi difícil chegar lá?

    A trajetória tem seus passos e curvas. Curioso observar que ao me formar em Direito, pela UFMG, em 1970, em momento algum coloquei a magistratura como um objetivo. As coisas vão acontecendo.

    Ao sair do seminário, em 1966, passei a dar aulas de português no Colégio Estadual de Pedro Leopoldo, onde fiz o meu “ginasial”, e, aprovado no vestibular, passei a fazer o curso de Direito. Em 1974, aprovado em concurso público no TCU, como técnico de controle externo, passei a trabalhar na Inspetoria Regional do TCU em Belo Horizonte, e parei de dar aulas em PL. Desde 1970 advogava, em Pedro Leopoldo, Matozinhos e Belo Horizonte. Passei então a fazer o doutorado em direito na UFMG, em 1975. Aberto o concurso para Juiz do Trabalho Substituto no TRT de MG, em 1978, por estímulo do Miranda, resolvi estudar, apesar de ter até então atuado apenas em quatro ou cinco ações trabalhistas. Fui aprovado e me tornei Juiz Substituto em 06 de junho de 1979, quando então passei a me dedicar de fato ao estudo de Direito e Processo do Trabalho. Até virei professor de direito na UFMG em 1985.

    Trabalhei inicialmente em BH, Goiânia e Conselheiro Lafaiete, tendo me tornado Juiz Presidente de JCJ em julho de 1980, em Coronel Fabriciano. A carreira foi rápida, pela carência de juízes, e trabalhei em Betim e Belo Horizonte até ser promovido ao Regional de Minas em julho de 1993 (ano em que minha esposa Lourdinha faleceu, em setembro).

    Em 1998, após ter sido convocado a trabalhar no TST, entrei em uma lista tríplice e foi nomeado Ministro do TST, com posse em 25 de junho. Lá exerci alguns cargos administrativos, como o de corregedor geral, assim como o de conselheiro do CNJ, tendo tomado posse como presidente em 05 de março de 2013, e me aposentado em 26 de fevereiro de 2014, por ter atingido 70 anos.

    Cada um de nós tem experiências em campos diversos, e sabemos que a dedicação e o compromisso são indispensáveis para exercer, dentro do razoável, uma profissão. De fato, ter exercido o cargo de presidente do TST se deve também a muitos amigos e, sobretudo, à família, sustentáculo para as horas de desafio.

    4 - Você vem de família tradicional e poderosa politicamente ou, em algum momento, se sentiu um estranho no ninho?

    Acho bom salientar que, se o cargo de ministro de tribunal superior fosse reservado a quem tivesse “cartucho” ou mesmo a membros de família tradicional e poderosa, eu nunca seria ministro. A maior parte dos juízes do Brasil hoje vem da classe média. Destaque-se de passagem o aumento expressivo, também, da presença das mulheres na magistratura. Nunca me senti estranho no ninho, vivendo “pari  passu” com colegas de várias regiões do país. O grande privilégio que tive foi ter estudado no seminário, o que me deu ótima base para enfrentar o vestibular e os concursos a que me submeti, e atuar profissionalmente.

    5 - O presidente atual João Batista Brito Pereira vem do Maranhão e seu antecessor, Ives Gandra da Silva Martins Filho, é paulista. Mas oito ex-presidentes são mineiros, inclusive o filho do presidente Delfim Moreira. O TST é um feudo de Minas?

    Conjugando a pergunta com a anterior, o presidente atual é de uma família simples, do interior do Maranhão, ao passo que seu antecessor é de família de prestígio jurídico nacional (saliente-se que o ministro Ives é uma pessoa simples). Os mineiros sempre tiveram presença expressiva no TST, composto de 27 ministros, o que pode se explicar pela qualidade dos desembargadores do TRT mineiro. A nomeação de ministros tem um aspecto político, pois a lista tríplice é elaborada pelo TST, mas a escolha cabe ao Presidente da República. Todos sabemos que Minas já teve muita influência na República, mas hoje ......  Quanto à presidência, no TST normalmente se observa a antiguidade no cargo de ministro.

    6  -  A justiça do Trabalho, criada pelo presidente Getúlio Vargas em 1941, está ameaçada de extinção pelo governo Bolsonaro. Você vê riscos para o trabalhador ou entende que este é um “aggiornamento” necessário?

    Olha, não é a primeira vez que esta ameaça é feita. Lembro-me, por estar no TST à época, que em 2002 o então senador Antônio Carlos Magalhães também assim procedeu. O que me preocupa é que se diz que “a Justiça do Trabalho está atrapalhando o progresso do país”, em uma ótica que coloca o econômico-financeiro como sendo a prioridade máxima. Claro que queremos o nosso desenvolvimento, mas jamais à custa dos valores sociais consagrados na Constituição. Afinal de conta, pode-se dizer que houve evolução se a dignidade e os valores humanos estão sendo sacrificados?

    O que se deve buscar, penso, é o equilíbrio entre os interesses sociais e econômicos. Aliás, a Constituição, no artigo 170, assenta que a ordem econômica é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa. A legislação trabalhista deve ser atualizada, para se adequar às situações emergentes, tendo-se cuidado para não fragilizar a situação do trabalhador, que é sempre a parte mais vulnerável.

    A Justiça do Trabalho, pelo seu histórico, tem sido muito importante para se obter esse equilíbrio. Não está isenta, como qualquer Justiça, de cometer seus erros, e o ideal é que seja em número muito reduzido e que seja possível sua reparação.

    7 - Na sua opinião, quais são os grandes juristas trabalhistas do Brasil?

    Tivemos e temos muitos, pelo Brasil afora. Restrito a Minas, menciono os professores Paulo Emílio Ribeiro de Vilhena, Messias Pereira Donato e Alice Monteiro de Barros, minha colega de faculdade. Hoje, cito Antônio Álvares da Silva, Maurício Delgado, Sebastião Geraldo de Oliveira, Cléber Lúcio de Almeida, Vítor Salino, entre outros.

    8  -  Nascido em Pedro Leopoldo, você estudou no seminário de 1959 a 1965. Como foi sua experiência no Coração Eucarístico?

    Foi muito boa. Um extraordinário privilégio. Lembro-me de que, quando fui aprovado no concurso de Juiz do Trabalho, procurei o Padre Arnaldo Ribeiro, que fora Reitor na nossa casa, e agradeci por tudo que recebi. Os estudos, o aprendizado da oração, o convívio fraterno. Se muito recebemos, os nossos compromissos são maiores. Peço sempre a Deus que nos dê forças e alimente nossa fé para continuarmos na trajetória de compromisso com o Cristo.

    9 - Chegou a estudar filosofia e a receber batina? Tem uma foto para nos enviar?

    Estudei filosofia a partir de 1961, e fui até o segundo ano de Teologia, em 1965.  Usei batina, recebi tonsura e as duas primeiras ordens menores (ostiariato e leitorato).

    10 -  Fale de seus contemporâneos. Quem se ordenou padre? Algum bispo?

    No Seminário Menor tinha como colegas de turma Miranda, Pereira,  Valter Rosa, Dauro, Geraldo e Gonçalo (o Cabo).

    Da turma de Seminário Maior, convivi com Reginaldo, Judas Tadeu, Geraldo Lírio (arcebispo de Mariana), Palombo. Alberto Taveira era dos petrinos onde fui regente.  Na minha turma só se ordenaram os Padres Pigi e Paulo Padovani, que foi quem celebrou o meu primeiro casamento, em dezembro de 1972.

    11 -  Apresente-nos sua família.

    Com Lourdinha, que faleceu em setembro de 1993, tivemos Michelle, Taciana e Fabíola. Deram-me cinco netos, as quatro primeiras mulheres (Amanda, Mariana, Isadora e Yasmin) – até pensei que seria especialista em mulheres – e por último, hoje com seis anos, o Luiz Fernando.

    Com Eliane, prima com quem me casei em julho de 2005, sob as bênçãos do Padre Lázaro, não temos filhos.

    No meio deste ano, a Amanda já vai formar em Direito, pela Fumec.

    12 - Depois que deixou o TST, como tem sido sua vida profissional.

    Trabalho em Brasília, em escritório de advocacia, fazendo algumas viagens, para não ficar “enferrujado” e para me sentir útil, tentando manter contato frequente com a família, abrangendo também irmãos, sobrinhos e primos, e amigos.

     

    JD Vital