A VOZ DO PASTOR - O QUE PRETENDE A IGREJA?
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O QUE PRETENDE A IGREJA?
A Igreja de Belém olha para os trezentos anos de sua criação comoDiocese. No próximo dia vinte e dois de fevereiro, em celebração eucarística presidida por Dom Giovanni D’Aniello, Núncio Apostólico no Brasil, faremos a grande ação de graças, iniciando um ano jubilar que terá como colunas as Visitas Pastorais Missionárias, atendendo ao convite do Papa Francisco, que convocou um mês missionário especial para outubro de dois mil e dezenove. Para nós, a grande Missão de outubro é o Círio de Nazaré! Além disso, neste ano os Bispos de toda a Amazônia estarão reunidos em Roma, com o Papa para um Sínodo Episcopal Especial. Sínodo é uma reunião de Bispos, quando o Papa apresenta um tema a ser aprofundado e depois a ele apresentado para as necessárias orientações pastorais. De sete a vinte e seis de outubro, os Bispos participantes, todos dos nove países da Amazônia, serão acompanhados pela fervorosa oração do Povo de Deus. Este é um tempo especial da graça de Deus para todos nós, e não temos o direito de desperdiçá-lo!
Ao comemorar o nosso Jubileu, faremos muitas perguntas sobre nossa missão de Igreja na Arquidiocese e na Amazônia. A esta altura, queremos verificar as nossas “pretensões”. No domingo que estamos para celebrar, ouviremos a proclamação das bem-aventuranças na versão do Evangelista São Lucas (Lc 6,17.20-26). Depois de escolher doze apóstolos entre seus discípulos, Jesus desceu da montanha, onde havia permanecido em oração, para encontrar a multidão que a ele acorria. “Vieram para ouvi-lo e serem curados de suas doenças. Também os atormentados por espíritos impuros eram curados. A multidão toda tentava tocar nele, porque dele saía uma força que curava a todos” (Lc 6,18-19). Nossa Igreja também é feita de uma imensa multidão, consciente da força irresistível de Jesus, desejosos todos de ir ao seu encontro, para dele saber o que faremos para realizar, também em nosso tempo, o mandato missionário da evangelização.
Nossa Igreja quer ser fiel ao Evangelho e ouve a proclamação de Jesus: “Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus!” Vivemos numa região com grandes desafios. Os que são socialmente pobres constituem a maior parte de nosso povo santo. Sem desprezar quem quer que seja, nossa Igreja quer incluir os que estão ou se sentem mais distantes e excluídos. Daí se entende a força missionária com a qual estamos implantando Paróquias e Áreas Missionárias nos pontos mais desafiadores de nossa Arquidiocese.
“Bem-aventurados vós que agora passais fome, porque sereis saciados! Bem-aventurados vós que agora estais chorando, porque haveis de rir!” Não nos é lícito fechar os olhos, os ouvidos e os bolsos às necessidades dos mais sofredores. Desejamos ser presença consoladora junto dos que sofrem. Nossa Igreja quer tomar a iniciativa da partilha, para que os bens sejam postos em comum e não haja necessitados entre nós, de acordo com a proposta dos Atos dos Apóstolos.
“Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, expulsarem, insultarem e amaldiçoarem o vosso nome por causa do Filho do Homem.” Se muitas vezes os cristãos não são compreendidos, mas julgados e condenados, desejamos crescer na coerência com o Evangelho, caminhando contra a correnteza do egoísmo da corrupção, da falsidade, da impureza e o relaxamento.
Na primeira vez que encontrei o Papa Francisco, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude do Rio de Janeiro, olhou-me o Santo Padre com uma força incrível. Foram fortes as suas palavras: “Tenham coragem! Sejam ousados! Se não forem ousados, já estão errando de princípio”. No mesmo dia, no encontro do Papa com os voluntários da Jornada, tive a alegria de presenteá-lo com uma Imagem de Nossa Senhora de Nazaré, a pessoa mais corajosa e ousada da história. Com singeleza, o Papa apenas olhou-me com profundidade e perguntou, a modo de uma criança: “É para mim?” E recebeu a Imagem da Rainha da Amazônia!
Ao fazer agora a pergunta sobre nossa “pretensão”, desejo que sejam acolhidas como nosso programa algumas palavras ousadas do Papa na Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”: “Primeirear, envolver-se, acompanhar, frutificar e festejar. A Igreja em saída é a comunidade de discípulos missionários que ‘primeireiam’, que se envolvem, que acompanham, que frutificam e festejam. Primeireiam – desculpai o neologismo –, tomam a iniciativa! A comunidade missionária experimenta que o Senhor tomou a iniciativa, precedeu-a no amor (Cf. 1 Jo 4, 10), e, por isso, ela sabe ir à frente, sabe tomar a iniciativa sem medo, ir ao encontro, procurar os afastados e chegar às encruzilhadas dos caminhos para convidar os excluídos. Vive um desejo inexaurível de oferecer misericórdia, fruto de ter experimentado a misericórdia infinita do Pai e a sua força difusiva. Ousemos um pouco mais no tomar a iniciativa! Como consequência, a Igreja sabe ‘envolver-se’. Jesus lavou os pés aos seus discípulos. O Senhor se envolve e envolve os seus, pondo-se de joelhos diante dos outros para os lavar; mas, logo a seguir, diz aos discípulos: ‘Sereis felizes se o puserdes em prática’ (Jo 13, 17).
Com obras e gestos, a comunidade missionária entra na vida diária dos outros, encurta as distâncias, abaixa-se – se for necessário – até à humilhação e assume a vida humana, tocando a carne sofredora de Cristo no povo. Os evangelizadores contraem assim o ‘cheiro de ovelha’, e estas escutam a sua voz. Em seguida, a comunidade evangelizadora dispõe-se a ‘acompanhar’. Acompanha a humanidade em todos os seus processos, por mais duros e demorados que sejam. Conhece as longas esperas e a suportação apostólica. A evangelização patenteia muita paciência, e evita deter-se a considerar as limitações. Fiel ao dom do Senhor, sabe também ‘frutificar’. A comunidade evangelizadora mantém-se atenta aos frutos, porque o Senhor a quer fecunda. Cuida do trigo e não perde a paz por causa do joio. O semeador, quando vê surgir o joio no meio do trigo, não tem reações lastimosas ou alarmistas. Encontra o modo para fazer com que a Palavra se encarne numa situação concreta e dê frutos de vida nova, apesar de serem aparentemente imperfeitos ou defeituosos. O discípulo sabe oferecer a vida inteira e jogá-la até ao martírio como testemunho de Jesus Cristo, mas o seu sonho não é estar cheio de inimigos, mas antes que a Palavra seja acolhida e manifeste a sua força libertadora e renovadora. Por fim, a comunidade evangelizadora jubilosa sabe sempre ‘festejar’: celebra e festeja cada pequena vitória, cada passo em frente na evangelização. No meio desta exigência diária de fazer avançar o bem, a evangelização jubilosa torna-se beleza na liturgia. A Igreja evangeliza e se evangeliza com a beleza da liturgia, que é também celebração da atividade evangelizadora e fonte dum renovado impulso para se dar” (Evangelii Gaudium 24). Com esta alma, espero todo o povo de Deus na festa do dia vinte e dois de fevereiro, no Mangueirinho, para festejar nossa unidade e fidelidade à Cátedra de Pedro!
Dom Alberto Taveira