ESCRITOS HELÊNICOS - MITO DA CAVERNA




Clique aqui para ampliar

Clique aqui para ampliar
  •  

    Mito da Caverna

    Platão – em A República

    O filósofo grego Platão, há quase 2.500 anos, já afirmava que o mundo que conhecemos não é o verdadeiro. A realidade não está no que podemos tocar, ouvir, perceber. Na filosofia de Platão, existem dois mundos: O primeiro é aquele que podemos perceber ao nosso redor com nossos  cinco sentidos; o outro é o mundo das idéias e tudo é perfeito e inevitável. Não podemos tocá-lo. Ele não é concreto. Só o pensamento nos pode levar até lá.  Para entender isso, vamos conhecer uma história que Platão criou.

    Imaginemos homens que vivam numa caverna cuja entrada se abre para a luz, em toda a sua largura, com um amplo saguão de acesso. Imaginemos que esta caverna seja habitada por prisioneiros que nasceram aí e esses habitantes tenham as pernas e o pescoço amarrados de tal modo que não possam mudar de posição e tenham de olhar apenas para o fundo da caverna, onde há uma parede. A luz de uma fogueira projeta na parede a sombra de tudo o que se passa lá fora. Imaginemos ainda que, bem em frente da entrada da caverna, exista um pequeno muro da altura de um homem e que, por trás desse muro, se movam homens carregando sobre os ombros estátuas trabalhadas em pedra e madeira, representando os mais diversos tipos de coisas. Imaginemos também que, por lá, no alto, brilhe o sol. Finalmente, imaginemos que a caverna produza ecos e que os homens que passam por trás do muro estejam falando de modo que suas vozes ecoem no fundo da caverna. Os prisioneiros acham que, o que vêm, é realidade. Nunca viram a luz.

    Se fosse assim, certamente os habitantes da caverna nada poderiam ver além das sombras das pequenas estátuas projetadas no fundo da caverna e ouviriam apenas o eco das vozes. Entretanto, por nunca terem visto outra coisa, eles acreditariam que aquelas sombras, que eram cópias imperfeitas de objetos reais, eram a única e verdadeira realidade e que o eco das vozes seria o som real das vozes emitidas pelas sombras.

    Nossa vida para Platão é como a dos prisioneiros do mito, acorrentados no fundo da caverna. Vemos as coisas que conhecemos como se fossem reais, mas não passam de sombras, de ilusão. Suponhamos, agora, que um daqueles habitantes consiga se soltar das correntes que o prendem. Com muita dificuldade e sentindo-se frequentemente tonto, ele se voltaria para a luz e começaria a subir até a entrada da caverna. Com muita dificuldade e sentindo-se perdido, ele começaria a se habituar à nova visão com a qual se deparava. Habituando os olhos e os ouvidos, ele veria as estatuetas moverem-se por sobre o muro e, após formular inúmeras hipóteses, por fim, compreenderia que elas possuem mais detalhes e são muito mais belas que a sombra que antes via na caverna, e que, agora, lhes parece algo irreal ou limitado.

    Assim, entendemos que a verdade está fora da caverna, no mundo das idéias, ou seja, é preciso desconfiar do que nossos olhos ou nossos ouvidos vêem. Devemos nos guiar pelo pensamento e pela razão.

    Suponhamos que alguém o traga para o outro lado do muro. Primeiramente ele ficaria ofuscado e amedrontado pelo excesso de luz; depois, habituando-se, veria as várias coisas em si mesmas; e, por último, veria a própria luz do sol refletida em todas as coisas. Compreenderia, então, que estas e somente estas coisas seriam a realidade e que o sol seria a causa de todas as outras coisas. Mas ele se entristeceria se seus companheiros da caverna ficassem ainda em sua obscura ignorância acerca das causas últimas das coisas. Assim, ele, por amor, voltaria à caverna a fim de libertar seus irmãos do julgo da ignorância e dos grilhões que os prendiam. Mas, quando volta, ele é recebido como um louco que não reconhece ou não mais se adapta à realidade que eles pensam ser a verdadeira: a realidade das sombras. E, então, eles o desprezariam....

    Platão denomina “doxa” (opinião) esse tipo de conhecimento vulgar obtido pelas impressões sensíveis e mostra a superioridade da “episteme” ( conhecimento inteligível do “real e verdadeiro) sobre aquele. Vimos que um dos acorrentados consegue romper as correntes, escalar as paredes da caverna, conhecer a luz e compreender que tudo que haviam aprendido a vida inteira é falso!

    Mas, tristemente essa superioridade não prevalece: Quando retorna  à caverna e informa aos antigos companheiros a verdade que descobriu, eles resolvem a contradição de um modo bem simples: desprezam-no e depois o matam. Afinal, ele só pode ser louco ou mentiroso, pois os acorrentados “sabem” que a verdade é aquilo que se encontra naquela parede: eco e sombras...

    Em nossa língua “fanático e fã” vêm de mesma raiz latina: “ Fanum”, relativo a um templo religioso. Já aquele que se encontra à frente (“pro” ) ou fora dele era “ profanum”, origem de nosso termo “ profano”.

    Mas toda “língua” ( idioma formal de um  povo, manifestado oral e graficamente por meio de um sistema de vocabulário e sintaxe) inclui uma “linguagem” ( um modo popular de ser exprimir pela fala).

    Assim,  por meio da linguagem,  o significado original de “fanático” ( entusiasta) adquiriu conotação pejorativa de “ desvairado”, “ intolerante”, que aceita, cegamente preceitos de uma religião ou de doutrina política, ou age exageradamente em relação a uma pessoa, a um time de futebol etc, enquanto que, ao encurtamento desta palavra  para fã” atribuiu-se uma conotação amena, logo, não pejorativa (admirador, apreciador).

    É perda de tempo tentar argumentar com m “fanático” sobre as más qualidades de seu time de futebol, sobre falsidades contidas no discurso político.

    Assim, se se sai da “caverna” e novamente volta lá para convencer os que lá permaneceram a descobrir novos horizontes, corre-se o risco de ser humilhado, ironizado e não ter seus novos conhecimentos aceitos.

    Heleno Célio Soares